segunda-feira, 17 de setembro de 2012

imobilidade

Olho pelo vidro embaçada do ônibus e penso se por um acaso você ainda pensa. Em tudo.
Se eu do lado de cá da cerca posso me sentir importante e crer que do outro lado da fronteira tem alguém que mesmo em outro contexto compartilha alguma lembrança remota comigo.

E talvez só a possibilidade já seja o suficiente, já me faça pular sobre poças na rua. E me molhar um pouco e nem assim importar-me.

Um tempo atrás estava você sentado ao lado da janela. Não dessa. E eu parada na plataforma. As pessoas movimentando-se apressadas, as bagagens sendo guardadas uma a uma até restar somente algo que não podia ser levado - e insistia em não partir.
Parada. Olhando fixo.
Os outros passageiros provavelmente pensando que eu tinha me inspirado em algum filme de domingo qualquer, que queria fazer um ato romântico. Alguns talvez pensassem que eu ia desenhar um coração com as mãos, soprar um beijo.
Mas não. Fiquei porque não pude ir embora.

Encarei aquele pedaço de você recortado no meio de vultos desimportantes e não piscaria (se apenas tivesse tal capacidade). Não desviei nem o pensamento do meu alvo - talvez se o tivesse feito, teria me sentido a tola que era.
O motor ligou e o que me restou a fazer foi acompanhar o movimento ao redor da esquina, rotando em mim mesma, junto com ele. Corri atrás, como se fosse mudar algo. Diversos olhos me encaravam de dentro do ônibus e só vi os teus. Na cena ápice dessa película de mal gosto.
O semáforo me deu mais alguns segundos, corri atrás e ao atravessar a larga avenida, parei em frente às luzes brilhantes dos faróis. E talvez devesse ficar ali. E o clímax traria um atropelamento dramático.

Mas segui. Cheguei ao outro lado e vi você distanciar até não poder mais diferenciar nada entre os automóveis que se perdiam ao longe.
Esperando que outro dia você voltasse pelo outro lado da rua, em minha direção.
E fiquei ali mais um tempo. Não porque queria. Porque não podia ir embora.

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