quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

guarda noturno

Resisto ao sono contemplando o céu: constelações, revelem-me suas confidências. São, no entanto, todas mudas. Sinto o dia pesar sobre minhas pálpebras; o som do motor dos carros na avenidade funde-se com a própria respiração da noite.

Minha resposta parece tão próxima, mas na penumbra não a vejo. Paciente, viro sentinela de minha janela.

segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

Monocromático

Nicole sempre tão verde.




Nunca vi alguém tão verde como Nicole.

retratos amarelos de um domingo

Sobre um fim de semana de Natal sozinha em casa com uma câmera à disposição..





Acho graça em fotos caseiras de desconhecidos - nas minhas, nem tanto.




Acho que só vou saber apreciá-las quando o contexto na qual as tirei pertencer ao passado.


Também, de ser eu já sei.

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010



Sentada no limite da calçada, encolhida, fumava seu cigarro: não tinha gosto, se o tivesse, seria de sarjeta. As outras pessoas na parada de ônibus esperavam ansiosas suas conduções, atentas aos letreiros no topo. A menina no chão também os olhava, mas os destinos lhe pareciam códigos... Um após o outro, nenhum indicava seu caminho.

Deu mais uma tragada só para manter suas mãos ocupadas, não sabia o que fazer com elas: pareciam grandes e ao mesmo tempo pequenas demais. Apertou a mochila pensando nos seus pertences que organizara prontamente, apesar de não se lembrar direito o que a fizera resolver ir embora. Talvez fosse melhor não levar nada. Se engasgou com a fumaça e jogou o cigarro longe, aquilo também não lhe fazia sentido.

Seu ônibus não chegava nunca.

domingo, 19 de dezembro de 2010

finito

Tenho surtos de saudades intensas. De tal maneira que, às vezes, não conseguiria colocar nem etiqueta - não sei do quê, só sei que sinto. Nostalgias infinitas até mesmo do trivial: do sol que nunca irá se pôr do mesmo jeito, do cabelo que não formará novamente o mesmo cacho, da palavra que só fará sentido ao ser pronunciada (e ao lembrá-la, me parecerá longínqua e irreal)...

Brigo constantemente com a efemeridade, que insiste em aparecer nos momentos mais dignos da eternidade. Posso fingir que ela não está presente no ringue: aproveito as horas, que viram minutos, com o rosto virado para outro lado, mas logo sinto seu toque brusco em meu ombro. Enterro meus dedos fundo na grama, agarro-me às raízes; no entanto, a areia, indiferente, desce a ampulheta em uma maldosa homegeneidade.

Drummond, ensina-me a lidar com tais coisas findas, que são tão lindas.

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

incerteza certeira

Às vezes, as palavras faltam, as cores se misturam e o olhar fica opaco: me perco entre minhas próprias paredes. Cega, me debato por temer perder o controle - meu paradoxo inevitável.

Só me reencontro quando admito que o chão sob meus pés não é tão sólido assim. Preciso, afinal, sentir a incerteza e o assombro percorrendo meu corpo em forma de arrepio. Que o gosto agudo da redenção entre meus lábios!

Paraliso. Escuto atenta. Estendo a mão e espero que algum eco me guie.

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

façade

Que vontade de mudar em mim!
De olhar as mesmas coisas e vê-las novas
Exercício diário de crer ser uma
O outro, de fora, aponta: és outra!

Espelho retorcido e empoeirado,
saia do meu caminho,
ou revele sua miragem,
pois creio ter sempre o igual sem forma.

Orbito minhas luas, transformo-me,
e no entanto, no quê?

Cada dia, cada lente, cada luz distinta
mostra um ângulo recém descoberto
Mas não é suficiente
- nunca encontro a real face e nunca saberei como arrancá-la.

domingo, 12 de dezembro de 2010

nem tão estranho

O ar fluia em círculos pelo quarto: dançava até encontrar as paredes que o mandavam de volta ao centro do cômodo em forma de ondas. Ela, sentada sobre o emaranhado de cobertores que formava uma mistura de têxturas e cores (impossível de ter sido planejada), respirava a atmosfera em silêncio.

A familiridade daquele cheiro, da luz que os cumprimentava no início do dia ao invadir as pequenas frestas da persiana, dos livros que não eram seus - mas que ela já decorara todos os títulos... Tudo ia aos poucos encontrando lugar em sua memória sem que ela percebesse e, quando encontrava algo que fora trocado de lugar, se surpreendia por notar.

O pato amarelo de plástico a encarava do alto da prateleira, aquele ridículo adorno, e agora ela não precisava fingir simpatia ao mesmo: mostrou-lhe a língua. Inalcançável ave, que, secretamente, ela desejava esconder nas profundezas de uma gaveta, longe de qualquer olhar que pudesse desvendá-la. No entanto, aquilo não lhe pertencia, tinha de engolir aquela afronta em forma de desaforo. Quem, afinal, usaria tal animal detestável como enfeite?

Com um estalido, a porta abriu-se para trazer o elemento que faltava àquele quadro, o ar tornava-se ainda mais concentrado de todas aquelas essências. A verdade atingiu-lhe, súbita: gostava do ridículo marreco, com seu bobo brilho amarelo tão particular. Talvez - e isso agora lhe parecia deveras formidável - ela também fosse uma peça daquele ambiente, tão tola com seu cabelo rosa e suas meias coloridas. Pode jurar escutar um "quack" de aprovação e riu sozinha, tranquila.

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

câmara clara

Não me surpreende que a fotografia me seduza tanto: "observar", que é o primeiro passo para o clic, é, provavelmente, o verbo mais utilizado por mim neste blog. Creio que esta eterna vigilância seja parte da minha natureza, ou foi incluída nela pela minha criação em meio a psicologias infinitas (e tantas vezes irreais)

Pode parecer que ao colocar-me nesse papel externalizado eu sinta-me não pertencente e ímpar - ao contrário, enquanto olho para os outros, estou, em primeira instância, analisando a mim mesma. Quer eu goste, ou desgoste.



Que a câmara escura me traga laudos em forma de imagens.

terça-feira, 30 de novembro de 2010

Centro de Porto Alegre

É quase um consolo, essa indiferença conjunta. Linda, livre e repugnante.



Posso passar horas observando o movimento, quase hipnotizada, e mesmo assim não entender o mecanismo. O pedinte, jogado ao chão, estende no ar a mão, sem amparo, e nem ele olha para cima, e nem os outros para baixo. Todos os rostos sem face.

É algo que só faz sentido quando se está participando da dinâmica: do lado de fora, parece simplesmente desumano.

segunda-feira, 29 de novembro de 2010

meio centavo por um pensamento ruim

Sou favorável ao estranho: é sempre mais confiável. Do incomum espero tudo, ao que chega já preparo meus velhos conceitos para serem quebrados, talvez substituídos por novos - ao menos há movimento.

O problema é o costumeiro: sempre desconfio de quão legítimo é. Dá a falsa sensação de normalidade, e esse sim é o conceito mais inútil já criado.

sábado, 27 de novembro de 2010

mergulho

Quero velejar. Ter a coragem de viajar milhas sem ter à vista objetivo algum, somente o mar infinito a extender-se no horizonte, e mesmo assim, prosseguir de peito aberto. Minha luneta sem foco, minha bússula sem norte, em uma pirataria às avessas: desconquistarei todas as terras que possuo!

Que as ondas agitadas me embalem em seu movimento urgente, nada a expressar senão a própria dança - que me hipnotiza em suas marés.

Quero minha alma mergulhada naquela água salgada, cheia, e que transborde! Que o sol também encha meus olhos, que me envolva em um clarão sem formas, e que me cegue!

Mar, quero mais é que você me afogue.

terça-feira, 23 de novembro de 2010

inútil

Um dos prazeres da fotografia é capturar momentos inúteis, que não tem o mínimo valor fora daquele enquadramento.Se for para ser assim, que seja então espontâneo: me contorço, faço de conta, fotografo até flor se for pra despistar meu alvo(e veja bem que odeio estas!) - se isso me der a oportunidade de presenciar aquele bocejo despretensioso ou colecionar mais um rosto sem nome no meio da multidão.

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

(não) permanecer




Eu não lhe peço para prometer ficar - é essencial, no entanto, que desejes que isso fosse possível.

terça-feira, 16 de novembro de 2010

Contra-tempo

No corredor que separava os dois lados da avenida, o casal montava um cabo de guerra entre ir e ficar.

-Não me venha com meias-verdades. – o resto das palaras dele foram carregadas pelo ar.

Ela acompanhava o passar dos carros com os olhos, esperando o momento de atravessar. Ouvia as palavras dele, mas também não faziam sentido. Eles não eram assim.

Ele fez menção de pegar na mão dela, com o intuito de obrigá-la a passar para o outro lado, mas esta recuou indiscretamente. Olhou-a com uma sobrancelha arqueada, se negando a acreditar no circo que montaram. Mas estava feito.
- Isso não pode ser sério.
- Me observa então – e ela cruzou os braços, não se preocupando em aparentar infantilidade.
Como que para pontuar a frase dela de forma dramática, um trovão fez-se ouvir, dando inicio a uma chuva de gotas largas e espaçadas.

Quem cederia primeiro? Certamente não o vento, que agitava suas roupas pra lá e para cá incessantemente; nem os veículos, que passavam velozes de ambos os lados; os pedestres então, não percebiam aquele impasse mortal.

No entanto, se algum passante por acaso parasse para notá-los, acharia a cena um tanto tétrica: os dois espremendo-se no canteiro entre as largas avenidas; porém, ao mesmo tempo, procurando, de forma meticulosa, não tocar um no outro. Suas expessões eram tensas, gesticulavam e gritavam frases mudas de ódio, juravam a morte e a planejavam, com requintes de crueldade. Seus olhares se encontravam, ariscos, para então fugirem e voltarem à pose.

Os espaços entre os momentos secos e os molhados apertavam. Ele cruzou os braços também e deixou escapar um grunido emburrado entre os dentes. A chuva persistia, cada vez mais cerrada. Ela arrepiava-se de frio conforme a água deslizava para dentro de seu casaco; ele queria esquentar as mãos nas costas dela, por dentro de sua blusa.

Após muito tremerem,centenas de carros passarem,infinitos pensamentos de vingança cruzarem suas mentes; estavam ambos na calçada do outro lado, agarrados, como se nunca tivessem se soltado. Talvez nem lembrassem o motivo da discussão. Agora, podiam até sentir o sol, que voltara, começar a secar suas roupas.

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

desvio




Só para lembrar que, conforme o por mim planejado desde o início, este blog é exclusivamente sobre fotografia.

terça-feira, 9 de novembro de 2010

lack of colour

Acordei com essa sensação urgente ao redor do meu pescoço, de sufoco. Sentei-me rápido na cama, arfando, tentando em grandes goles capturar o ar ao meu redor, o peito projetando-se instantaneamente para frente. O braço esticado alcançou a janela e escancarou-a; mas ao invés do refresco, senti o calor. O céu estava estático e de uma cor de nada em particular.

Meus olhos encheram-se desse reflexo do nada. Abri e fechei a boca, em gestos inúteis, espasmava, de forma tola. Não sabia também gritar. Meu corpo pesou de volta ao colchão, afundando em meio às cobertas, inerte.

Senti, então, algo pesado passando pela minha garganta, lento, rastejando pelo meu corpo como um verme– a quantidade era pequena demais para encher meus pulmões, mas grande o suficiente para que eu continuasse consciente.

Tudo que via era o escuro teto, com sua indiferença de teto. Passei as mãos pelo colo, pelo pescoço e rosto, mas não havia o que encontrar. Livrei-me das roupas de cama; das minhas, também. Queria, o que quer que fosse, fora de mim naquele exato instante - pensamentos que não eram meus agora tomavam lugar. Abri a gaveta da cabeceira e tateei até encontrar a tesoura, levei-a ao meu cabelo e, em um gesto firme, livrei-me deste também. Me livraria de minha própria pele, se possível.

Levantei-me, procurando fugir do contato imediato de qualquer coisa. Onde está, onde está, há algo há algo sei que há algo em algum lugar sei que está. Com um clic, liguei o interruptor. A atmosfera se suspendeu só para a seguir chocar-se com o chão. Não havia nada, afinal, só meu corpo recuado contra a parede, trêmulo e só. Isto e minha garganta, sufocada neste nada.

domingo, 7 de novembro de 2010

Im not there




Hoje próximo a mim no onibus, havia um senhor que falava alto sozinho. Discursava e argumentava exasperado: “mas é ai que você se engana! Não foi assim que aconteceu, lembra, tens que olhar por outra perspectiva!” Na verdade, sozinho era tudo que ele não estava. Sentia tanto a necessidade de alguém, que arranjara uma maneira de levar esta pessoa junto com ele.
Todos o olhavam pelo canto do olho, constrangidos, eu, porém, não quis interromper a conversa e continuei com a minha - mas em voz baixa.


A ironia em deixar alguém se aproximar tanto ao ponto de tê-lo sob sua pele é essa: uma vez que o outro ausente, o corpo, agora sozinho, perde o propósito. Sobra somente o eco, que é aquele que persegue indefinidamente, mas nunca alcança.



Já diria o Leandro: uma piscina vazia pode ser metáfora para quase tudo na vida.

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Abri meus olhos para encontrar os teus, cerrados. O sol, alto no céu, fazia deitar sombras que desenhavam no seu rosto o contorno dos cachos de cabelo que lhe caiam à testa, fiquei observando-os, tentando encontrar padrões. Me distraí, então, no desenho dos teus cílios alongados.

-Eu sei que tu tá de olhos abertos. – você falou, pelo canto da boca, sem desgrudar os lábios dos meus.

- Ah, to nada. – ambos sabiam que se tratava de uma mentira. Você fingiu não se importar.

Passei do seu rosto ao casal ao fundo, me perguntando se éramos semelhantes a eles. Estavam enroscados em uma posição estranha: deitados na grama, a moça com o queixo apoiado no peito do namorado, que subia e descia com a respiração, entrecortando o fluxo de olhares. Eram; no entanto, persistentes, ele entortava a cabeça ao que ela esticava o pescoço, tudo para voltarem a trocar as faíscas e suspiros.

Detestei-os e achei-os estúpidos. Trocando juras de amor que os fariam melhores do que eram, exceto de que não eram melhores e nem piores por elas. Alienados a tudo ao seu redor, aproveitavam de maneira despreocupada o momento - para cada beijo que os aproximava, davam um que os afastava; contudo, estavam alheios a tudo isto.
Invejei-os. Fechei os olhos e pude sentir seus lábios, entre os meus, formarem um sorriso.




P.S.: A foto faz parte de uma série que tirei em Buenos Aires, de pessoas desconhecidas (para mim). Pedi a esse moço para tirar uma foto dele e ele, rápido, disse: "Ela pode sair junto?". Concordei, ele, mais rápido ainda, puxou-a para perto e sorriram para a câmera.

quinta-feira, 28 de outubro de 2010



Não se preocupe, criança – disse a mãe ajeitando-a no colo – essas preocupações irão passar.
Pousou a mão sobre seu peito, sentindo o pequeno coração bater, corajoso. Ela lhe mirava com os grandes olhos amendoados, curiosos. Sabia que, mais breve do que seria capaz de perceber, estes olhos infantis virariam cansados e opacos, como os seus agora eram.
-Logo você não se importará mais com isto.

E embalou-a ao sono.

terça-feira, 26 de outubro de 2010

bom dia




A vida inteira, neste instante, parece resumir-se ao farfalhar das árvores,
Suave
O pássaro congela o vôo e observa
Texturas e cores a percorrer a abóboda celeste
Óbliqua, a luz matutina toca minha face, em um convite ao dia
Da janela, promessas em cantos
Quantos estarão a mirar o mesmo horizonte?
Em um suspiro, uma última vez: toda a vida parece conter-se em uma gota de orvalho.

Persistente relógio, que não pode ser enganado,
Volta a correr; o mundo dos homens acorda
Passos apressados em caminhos opostos
Sons estridentes competem no ar
Ecoa o choro, alto,
Que clama pelo que não há de vir
Do alto, as nuvens descem, em poeira, à terra
A vida não é o que parece -
É o que ela é.

sábado, 23 de outubro de 2010

meias-palavras



Remexeu-se na cadeira, inquieta.

-Tu tá estranha.

Ela deu de ombros e encolheu-se dentro da camiseta para se aquecer, o tecido cheirava a sono.

-Sério, tá mesmo.

-Eu sou estranha, tu é estranho, isso de eu e tu é estranho, o mundo é estranho.

- Não acha que tu vai conseguir mudar de assunto.

Ela tirou os olhos do chão para pousá-los no rosto à sua frente e riu nervosa: tinha sido descoberta.

- É só que..que...

As palavras estavam lá, mas a claridade do dia a intimidava. Fechou os olhos e começou a falar antes que tivesse uma chance de ser interrompida.

- Sabe que couve-flor foi algo que eu sempre gostei: sem tempero; ou na salada, talvez na massa, melhor de tudo é quente depois de feita, mas vai até mesmo crua. Mas daí tem brócolis, que eu olho e acho que gosto, sempre me dá vontade de provar, mas vai saber entende?E não tem como voltar no tempo depois, é o tipo de coisa que não tem como fingir que não aconteceu- ela buscou rápido por folego e concluiu - Acho que seria uma traição com a couve-flor trocá-la por algo incerto que eu nem sei se funcionaria.

Céus, como ela consegue complicar tanto; ele pensou divertindo-se. Um silêncio constrastante pairava. Nunca uma cadeira foi tão desconfortável, ela respirou fundo novamante:

-Sim, tu não concorda? Fiquei em duvida de te falar porque talvez não devesse e seja desnecessário, do tipo, é só salada sabe... Mas, eu ao menos, acho que se trata de questao que deve ser levada com seried..

Os dedos dele calaram seus lábios e uma expressão de criança emburrada tomou lugar no rosto dela, para depois transformar-se em vergonha.

-Acho que as vezes eu falo demais. Por favor, faz eu parar de me constranger com besteiras e fala algo.

-Eu gosto de brócolis.

Falavam a mesma língua.

domingo, 17 de outubro de 2010

under my skin

Pele sobre pele. Pele sob pele. Pele que foi feita para se juntar com outra pele. Que sua, gruda e retorce. Pele que, depois, tímida, refletindo a fina luz que entra pelas persianas, cansada se recolhe; tremula receosa de algum olhar sobre si. Como se nada tivesse ali tomado lugar, agora uma tela em branco - pálida e arisca. Pele que me esconde, que te limita. É cárcere vivo, respirando meu ar, pulsando meu sangue, matéria inseparável que separa um de todos os outros.


Mas também, que alisa e, quando novamente em par, aquece. Se encontrada, esquiva; se re-encontrada, guia. E por esses breves instantes, contrariando todas as regras, funde-se à outra.

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

tarde chuvosa



Do lado de lá da janela, a chuva bate, sem preocupar-se. Aqui dentro, eu, trancada, ardo sem ver.

Como em uma sinfonia do acaso: minha respiração a subir, as gotas a descer. Alheias uma à outra, solitárias, porém, a formar um único compasso.

Ela rápida, eu atordoada; ela muda, minha voz falha. Rasga o céu nublado um trovão, meu grito abafado, com a ponta dos dedos trilho a cicatriz que deixou sobre a minha pele.

Do alto, mais uma gotícula cai e enquanto ela viaja pelo ar, em uma queda sem rumo, meu tempo pára, o vento cala, o peito suspende. Até que ela atinge o chão. Abro os olhos.

domingo, 3 de outubro de 2010

entreinstantes

Respiração longa é sempre sinônimo de frases curtas. Hesitação. O gesto insistente que percorre o cabelo, descuidado e nervoso, expressa o que faltou às palavras. Os olhares que se cruzam na velocidade do bater de asas, incertos. Mas mesmo na penumbra nenhum movimento passa despercebido.


O primeiro beijo é a única promessa que se cumpre no exato instante em que é proferida.

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Segredos




Guardo todos meus segredos em uma caixa a sete chaves, sem distinção. Os mais feios e tortos lá estão; assim como os belos - puras lembranças e esperanças. Não saberia dizer qual dentre estes se destaca, no início alguns tiveram seu valor, mas o tempo não lhes perdoa: serão esquecidos e cobertos de poeira. Como uma velha boneca de pano, antes tão amada, que a menina trancará atrás das pesadas portas do armário por vergonha de sua singularidade, e lá pelos anos de sua infâcia permanecerá.

Confissões que precisam encontrar seu lugar- soltas não hão de andar. Não suportaria deixar alguma para trás, levo-as juntas aos meus segredos para onde for, mas sempre trancadas - escondidas de qualquer luz que possa revelá-las a algum olhar curioso, inclusive o meu.

domingo, 19 de setembro de 2010

Noite e Dia



A noite ignora o relógio e logo chega - com ela traz a calma brisa que sussura em meus ouvidos, em um convite para que siga seus passos pela bruma sem fim.

Mas não hoje; hoje quero o sol a aquecer minha face enquanto vejo a tarde a correr mansa. Quero ver os tons do céu mudarem gradualmente, momentos surgirem e fugirem, fugazmente, ante meus olhos.

Verei a luz em sua íris refletir-se nas mais diversas cores e amanhã voltarei para percorrer o caminho por elas traçado.

domingo, 29 de agosto de 2010

Retrato azul de um domingo



Nunca conheci alguém que mudou de vida no domingo. Não se joga tudo pro alto no domingo, não se inicia dieta, não se tem primeiro dia de trabalho, não se encontra a alma gêmea.

Domingo é dia de trivialidades, de ver as video-cassetadas do ano anterior, de perguntar para a vizinha como vai a família, de ver se chove amanhã.. Todos os domingos poderiam ser resumidos em um só.


Em semanas com dias tão ordinários, para que inventar o tal de domingo?

sexta-feira, 20 de agosto de 2010

o primeiro post é sempre o..

De In Between Pictures



Fazer as coisas de maneira apropriada, sim? Esse blog é pra eu colocar as minhas fotos das pequenas coisas do cotidiano que eu quero guardar, ou olhar uma segunda vez. Simples assim. Engarrafando minha vida em formato de fotogramas.