terça-feira, 16 de novembro de 2010

Contra-tempo

No corredor que separava os dois lados da avenida, o casal montava um cabo de guerra entre ir e ficar.

-Não me venha com meias-verdades. – o resto das palaras dele foram carregadas pelo ar.

Ela acompanhava o passar dos carros com os olhos, esperando o momento de atravessar. Ouvia as palavras dele, mas também não faziam sentido. Eles não eram assim.

Ele fez menção de pegar na mão dela, com o intuito de obrigá-la a passar para o outro lado, mas esta recuou indiscretamente. Olhou-a com uma sobrancelha arqueada, se negando a acreditar no circo que montaram. Mas estava feito.
- Isso não pode ser sério.
- Me observa então – e ela cruzou os braços, não se preocupando em aparentar infantilidade.
Como que para pontuar a frase dela de forma dramática, um trovão fez-se ouvir, dando inicio a uma chuva de gotas largas e espaçadas.

Quem cederia primeiro? Certamente não o vento, que agitava suas roupas pra lá e para cá incessantemente; nem os veículos, que passavam velozes de ambos os lados; os pedestres então, não percebiam aquele impasse mortal.

No entanto, se algum passante por acaso parasse para notá-los, acharia a cena um tanto tétrica: os dois espremendo-se no canteiro entre as largas avenidas; porém, ao mesmo tempo, procurando, de forma meticulosa, não tocar um no outro. Suas expessões eram tensas, gesticulavam e gritavam frases mudas de ódio, juravam a morte e a planejavam, com requintes de crueldade. Seus olhares se encontravam, ariscos, para então fugirem e voltarem à pose.

Os espaços entre os momentos secos e os molhados apertavam. Ele cruzou os braços também e deixou escapar um grunido emburrado entre os dentes. A chuva persistia, cada vez mais cerrada. Ela arrepiava-se de frio conforme a água deslizava para dentro de seu casaco; ele queria esquentar as mãos nas costas dela, por dentro de sua blusa.

Após muito tremerem,centenas de carros passarem,infinitos pensamentos de vingança cruzarem suas mentes; estavam ambos na calçada do outro lado, agarrados, como se nunca tivessem se soltado. Talvez nem lembrassem o motivo da discussão. Agora, podiam até sentir o sol, que voltara, começar a secar suas roupas.

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